quarta-feira, 15 de abril de 2015

Abril (construir/desconstruir)

É uma cidade que tem praia, mas não se usa.
Feito isso é você aqui dentro, uma praia que não se usa, imenso oceano cheio de emoção que às vezes se faz forte e as ondas alcançam as calçadas e me faz lembrar.
E não importa onde o mar esteja, ele nunca será nosso, acho que ninguém aguenta tamanha intensidade, a gente se afoga.

Quando eu era pequena minha mãe sempre falava "fica perto que o mar tá bravo" e eu sempre pensava que eu queria saber o que deixou o mar bravo, o que alguém fez em suas águas salgadas, quem não respeitou a grandeza de ter seu corpo tocado pela água mais imensa e viajada do mundo.

O mar tem gosto salgado, mas é doce quando a gente quer.

Você sempre foi assim, seu gosto salgado grudado na minha boca e mente que me deixava doce e depois amarga. a-MAR-ga é como você se mostrava para o mundo e se mostra. Amar é amargo.

Sempre tem aquele lance da sede depois que sai do mar, é um jeito do mar deixar a gente com saudade. Minha saudade é sede de você, do seu salgado que me deixava doce.

E como o mar grande me faz pequena, me faz nada, ser nada e não conseguir sair do lugar por mais que os braços e o corpo todo se canse de nadar contra maré. Amargo, contra-gosto.

Eu tentei colocar açúcar para ver se o doce permanecia por mas algumas horas, mas só me dava mais sede e te enjoava mais.

Seu mar é sujo e me deixa doente, mas eu sou viciada na sua podridão, nos lixos que estão impregnados no seu fundo e que, quando se movimenta muito, fica aparente em qualquer maré.

Seu mar é modificado por várias pessoas, por uso humano sem amor que me faz ter medo até de passar perto e olhar.

Tenho medo de molhar os pés na sua beira e querer mergulhar de novo, me afogando no sufoco que sua presença me traz e sua ausência disfarça.

Minha vó dizia que  "o mar é traiçoeiro". De novo você, parece bom quando a gente olha de longe, mas perto a gente perde o controle e ele nos domina.
Eu nunca tive medo do mar até que sua amargura quase me matou.

Eu construí meu castelo de areia na sua praia e você foi chegando aos poucos com ondas que chegavam cada vez mais perto  até que, quando eu olhei para o lado, você usou a onda mais forte e salgada pra destruir meu castelo de amor. E eu chorei feito criança que tem seu melhor amigo destruído sem entender direito o motivo. Minha mãe até tentou me oferecer sorvete, mas meu dia nunca mais foi o mesmo.

Minha boca nunca mais sentiu aquele gosto salgado e amargo e eu lavei os pés antes de calçar o chinelo, mas sempre sobra um pouco de areia que a gente não consegue tirar.